domingo, 11 de fevereiro de 2018

Luto: sobre a dor de amar


O luto

Sobre a dor de amar

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By Elaine Andrade*



A dor da separação

A ruptura de um laço amoroso produz em nós um estado de choque similar a uma forte agressão física. Quando a ruptura é brutal, essa dor, que também pode ser chamada de dor do amor, suscita em nós um profundo sofrimento- um dilaceramento da alma tal como um grito forte e mudo que brota de nossas entranhas. É isto, o luto.  E cada um vai vivê-lo de forma singular.

Sobre o amor

Amar é investir um sentimento em alguém ou em alguma coisa. Ao perder o objeto amado surge em nós uma confusão interna sobre aonde e a quem direcionar o amor. O ser enlutado agarra com toda  sua força às lembranças do ser amado como se tentasse, neste movimento, mantê-lo. De outra forma seria uma traição, principalmente nos casos do luto por morte.
Amamos porque buscamos a felicidade, como se nesta experiência encontrássemos a força de nossa vida. Amamos nossos pais, filhos, cônjuges, amigos, amamos nosso trabalho, nossas casas, nossos projetos e nisto nos sentimos seguros. Mas, como escreveu Freud:
“Nunca estamos tão mal protegidos contra o sofrimento como quando amamos, nunca estamos tão irremediavelmente infelizes como quando perdemos a pessoa amada ou seu amor”

Luto: uma batalha interna

A morte de um ente amado

Neste momento a mente trabalha incansavelmente para não deixar também morrer a imagem do amado. Havendo, algumas vezes, quase que um desligamento da vida do ser em luto. É preciso, no entanto, respeitar o enlutado. Este tempo é pessoal e depende da relação envolvida, da estrutura emocional do sujeito e de uma série de fatores que vão do tipo de morte, do vínculo  às experiências de vida.

Um rompimento de uma relação

Morremos um pouco a cada dia. Em cada experiência que passamos experimentamos uma finitude de alguma coisa. A separação indesejada produz um sofrimento que também pode ser compreendido como um momento de luto. E aqui há outras questões que podem estar envolvidas e que alteram, profundamente, a relação de amor próprio: o sentimento de rejeição e abandono.

A amputação de uma parte do corpo

Muitas pessoas que tiveram que amputar uma perna ou um braço relatam a sensação de, em muitos momentos, sentirem o membro tal como antes. Esta é, obviamente, uma mensagem enviada pelo cérebro. Mas da mesma forma ocorre com pessoas que perderam um ente querido, a perda de um membro do corpo é também um momento traumático e dolorido não só física mas também e, principalmente, emocionalmente.

Como superar o luto?

O luto envolve estágios que permitem um desligamento da dor através da elaboração do sofrimento. O luto nos coloca diante de nossos limites, é um momento que inevitavelmente somos forçados a nos reposicionar diante de nossa própria vida, da nossa identidade. Algo importante neste momento é perceber que não temos  que deixar de amar.  O que é necessário é transformar este amor e aprender a conviver de forma saudável com a imagem que ficará sempre em nós.
Vale ressaltar que, apesar de muitos afirmarem que o luto dura um ano, este tempo é pessoal.  E numa sociedade onde nunca damos espaço para a tristeza ou para expressão da dor, é comum o uso de medicamentos para minimizá-la ou anestesiá-la. Todavia, é aconselhável que, antes de qualquer medicação,  procuremos  profissionais qualificados; e nestes casos, tanto da área médica como psicológica.

Existe uma terapia do luto?

Essa é uma questão recorrentemente colocada quando se fala em luto. A partir da perspectiva psicanalítica, digo que o que existe é uma terapia para o sujeito que vive o luto. O luto, como já mencionado anteriormente envolve uma série de fatores objetivos e subjetivos que precisam ser levados em conta no processo terapêutico. Nossas histórias de vida, nossos traumas, nossas experiências diversas distingue-nos na travessia da dor de um luto. Esta dor evoca, portanto, todos esses traços que constituem nossa personalidade, tratar o luto é, então, atravessar um caminho de dor, de fragmentação e reconstrução de um sujeito. Neste sentido, o acompanhamento com um profissional pode se tornar essencial nessa travessia.


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*Elaine Andrade é psicóloga clínica na Catharsis, trabalha com a abordagem psicanalítica e atende crianças, jovens e adultos. Formada pela Universidade Federal de São João Del Rei, (Brasil) atualmente está a concluir o doutoramento com focus na imigração infantil na Faculdade de Psicologia e Ciências da Educação na Universidade do Porto.